sábado, 28 de novembro de 2009









Tempo
pretérito
perfeito
imperfeito
mais-que-perfeito
presente futuro
achado
reencontrado
na palma da mão
com linhas tecidas
bordadas
desfiadas
ao ritmo
do tempo
de te dar a mão


(roubei ao Tempo todas as noites em que o tempo se fez amanhecer)

sábado, 21 de novembro de 2009

Dance like no one is watching. Sing like no one is listening. Love like you've never been hurt and live like it's heaven on Earth." (Mark Twain)

"Autumn is a second spring when every leaf is a flower." — Albert Camus




Serendipity...a fortunate accident?

Gosto da palavra assim...de algum modo, serendipismo, ou serendipitismo...não soa tão bem. Gosto de pensar em Serendipity como a capacidade que se tem de atrair coisas boas. Quase como se se dissesse ao Universo: GOSTO DE VIVER, GOSTO DE PESSOAS, GOSTO DO MUNDO e, por isso, o Universo nos recompensasse com "fortunate accidents". mas será assim, ou será a nossa força, a nossa vontade, o nosso "fazer acontecer" que determina as coisas boas que aparecem no nosso caminhar pela vida?


A palavra Serendipismo foi criada pelo escritor britânico Horace Walpole em 1754, a partir de um conto infantil persa: Os três príncipes de Serendip, que conta as aventuras de três príncipes do Ceilão, que viajavam constantemente e constantemente faziam descobertas inesperadas, sem que conseguissem prever os resultados das mesmas...na verdade, eram três jovens príncipes sagazes.

Serendib é o nome que os comerciantes árabes da antiguidade deram ao Sri Lanka (a Taprobana, bem nossa conhecida de "os Lusíadas").Sri Lanka significa "Terra Resplandecente" em sânscrito. Foram os portugueses que a baptizaram de Ceilão.

Terra resplandecente, na base do conceito de "inesperados acontecimentos" (positivos, de resto). Que bela história, para tão bela palavra...

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Nuno Júdice, de novo..

Voltando à poesia de Nuno Júdice...porque é bela, sensível, tocante...
...ou apenas porque sim!


Plano

Trabalho o poema sobre uma hipótese: o amor
que se despeja no copo da vida, até meio, como se
o pudéssemos beber de um trago. No fundo,
como o vinho turvo, deixa um gosto amargo na
boca. Pergunto onde está a transparência do
vidro, a pureza do líquido inicial, a energia
de quem procura esvaziar a garrafa; e a resposta
são estes cacos que nos cortam as mãos, a mesa
da alma suja de restos, palavras espalhadas
num cansaço de sentidos. Volto, então, à primeira
hipótese. O amor. Mas sem o gastar de uma vez,
esperando que o tempo encha o copo até cima,
para que o possa erguer à luz do teu corpo
e veja, através dele, o teu rosto inteiro.

sábado, 14 de novembro de 2009

Música que vale a pena...

Jovens, lindas, profissionais de mão cheia, as Escala têm sido uma revelação após a sua participação no Programa Britain's Got Talent.



Chantal Leverton (Viola); Izzy Johnston (violino); Taysa Hodges (violoncelo) e Victoria Lyon (violono), são as jovens que constituem este quarteto. Vale a pena ouvir.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009


(Foto de uma das casas do Lugar dos Afectos, próximo de Aveiro)

Azul...
eis a minha cor preferida. Azul do Planeta azul, azul de mar e de céu. Azul de harmonia e bem-estar. Azul cobalto, azul céu, azul bebé...azul escuro, esverdeado, turquesa....AZUL!
Em tempos a cor dos servos, por contraposição com o vermelho, cor dos nobres, é também a cor do mirtilo, do miosótis (que nos diz "não me esqueças"), de lindas pedras preciosas...
Na tradição Wicca, o azul é a cor dos rituais relacionados com harmonia,paz e os sonhos...com a serenidade, a verdade e a compreensão. O azul-marinho corresponde à energia de Saturno; o azul claro; à inspiração e à energia de Aquário.

Azul: palavra presente em belas poesias e prosas de encantar. Eis um belo poema de Sophia de Mello Breyner Andresen:

Bebido o luar, ébrios de horizontes,
Julgamos que viver era abraçar
O rumor dos pinhais, o azul dos montes
E todos os jardins verdes do mar.

Mas solitários somos e passamos,
Não são nossos os frutos nem as flores,
O céu e o mar apagam-se exteriores
E tornam-se os fantasmas que sonhamos.

Por que jardins que nós não colheremos,
Límpidos nas auroras a nascer,
Por que o céu e o mar se não seremos
Nunca os deuses capazes de os viver.


Já Fernando Pessoa afirmou, de uma forma brilhante:

Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.


Um excerto de um texto de Clarice Lispector:

...sentou-se para descansar e em breve fazia de conta que ela era uma mulher azul porque o crepúsculo mais tarde talvez fosse azul, faz de conta que fiava com fios de ouro as sensações, faz de conta que a infância era hoje e prateada de brinquedos, faz de conta que uma veia não se abrira e faz de conta que que dela não estava em silêncio alvíssimo escorrendo sangue escarlate, e que ela não estivesse pálida de morte mas isso fazia de conta que estava mesmo de verdade, precisava no meio do faz de conta falar a verdade de pedra opaca para que contrastasse com o faz de conta verde-cintilante, faz de conta que amava e era amada, faz de conta que não precisava de morrer de saudade, faz de conta que estava deitada na palma transparente da mão de Deus,..., faz de conta que vivia e que não estivesse morrendo pois viver afinal não passava de se aproximar cada vez mais da morte, faz de conta que ela não ficava de braços caídos de perplexidade quando os fios de ouro que fiava se embaraçavam e ela não sabia desfazer o fino fio frio, faz de conta que era sábia bastante para desfazer os nós de corda de marinheiro que lhe atavam os pulsos, faz de conta que tinha um cesto de pérolas só para olhar a cor da lua pois ela era lunar, faz de conta que ela fechasse os olhos e os seres amados surgissem quando abrisse os olhos úmidos de gratidão, faz de conta que tudo o que tinha não era faz de conta, faz de conta que se descontraía o peito e a luz douradíssima e leve a guiava por uma floresta de açudes mudos e de tranqüilas mortalidades, faz de conta que ela não era lunar, faz de conta que ela não estava chorando por dentro...

Citando Carl Sagan:

Nós podemos explicar o azul-pálido desse pequeno mundo que conhecemos muito bem. Se um cientista alienígena, recém-chegado às imediações de nosso Sistema Solar, poderia fidedignamente inferir oceanos, nuvens e uma atmosfera espessa, já não é tão certo. Netuno, por exemplo, é azul, mas por razões inteiramente diferentes. Desse ponto distante de observação, a Terra talvez não apresentasse nenhum interesse especial. Para nós, no entanto, ela é diferente. Olhem de novo para o ponto. É ali. É a nossa casa. Somos nós. Nesse ponto, todos aqueles que amamos, que conhecemos, de quem já ouvimos falar, todos os seres humanos que já existiram, vivem ou viveram as suas vidas. Toda a nossa mistura de alegria e sofrimento, todas as inúmeras religiões, ideologias e doutrinas econômicas, todos os caçadores e saqueadores, heróis e covardes, criadores e destruidores de civilizações, reis e camponeses, jovens casais apaixonados, pais e mães, todas as crianças, todos os inventores e exploradores, professores de moral, políticos corruptos, "superastros", "líderes supremos", todos os santos e pecadores da história de nossa espécie, ali - num grão de poeira suspenso num raio de sol. A Terra é um palco muito pequeno em uma imensa arena cósmica. Pensem nos rios de sangue derramados por todos os generais e imperadores para que, na glória do triunfo, pudessem ser os senhores momentâneos de uma fração desse ponto. Pensem nas crueldades infinitas cometidas pelos habitantes de um canto desse pixel contra os habitantes mal distinguíveis de algum outro canto, em seus freqüentes conflitos, em sua ânsia de recíproca destruição, em seus ódios ardentes. Nossas atitudes, nossa pretensa importância de que temos uma posição privilegiada no Universo, tudo isso é posto em dúvida por esse ponto de luz pálida. O nosso planeta é um pontinho solitário na grande escuridão cósmica circundante. Em nossa obscuridade, no meio de toda essa imensidão, não há nenhum indício de que, de algum outro mundo, virá socorro que nos salve de nós mesmos.

"O menino azul" de Cecília Meireles:

O menino quer um burrinho
para passear.
Um burrinho manso,
que não corra nem pule,
mas que saiba conversar.

O menino quer um burrinho
que saiba dizer
o nome dos rios,
das montanhas, das flores,
— de tudo o que aparecer.

O menino quer um burrinho
que saiba inventar histórias bonitas
com pessoas e bichos
e com barquinhos no mar.

E os dois sairão pelo mundo
que é como um jardim
apenas mais largo
e talvez mais comprido
e que não tenha fim.

(Quem souber de um burrinho desses,
pode escrever
para a Ruas das Casas,
Número das Portas,
ao Menino Azul que não sabe ler.)

domingo, 8 de novembro de 2009

Nuno Júdice



Escritor, poeta, ensaísta, natural de Mexilhoeira Grande, Nuno Júdice foi Professor do Ensino Secundário, sendo actualmente professor da Universidade Nova de Lisboa. Colaborou no Jornal de Letras, foi conselheiro cultural da Embaixada Portuguesa em França e foi delegado do Instituto Camões.
Tem livros traduzidos em Espanha, Itália, Venezuela, Inglaterra e em França.
O seu primeiro livro de poesia foi publicado em 1972.
Em 2001, publicou "Pedro, Lembrando Inês"; reproduzo, aqui, uma passagem desta obra.




Nuno Júdice
Pedro lembrando Inês

Em quem pensar, agora, senão em ti? Tu , que
me esvaziaste de coisas incertas, e trouxeste a
manhã da minha noite. É verdade que te podia
dizer: « Como é mais fácil deixar que as coisas
não mudem, sermos o que sempre fomos, mudarmos
apenas dentro de nós próprios?» Mas ensinaste-me
a sermos dois; e a ser contigo aquilo que sou,
até sermos um apenas no amor que nos une,
contra a solidão que nos divide. Mas é isto o amor;
ver-te mesmo quando te não vejo, ouvir a tua
voz que abre as fontes de todos os rios, mesmo
esse que mal corria quando por ele passámos,
subindo a margem em que descobri o sentido
de irmos contra o tempo, para ganhar o tempo
que o tempo nos rouba. Como gosto, meu amor,
de chegar antes de ti para te ver chegar: com
a surpresa dos teus cabelos, e o teu rosto de água
fresca que eu bebo, com esta sede que não passa. Tu:
a primavera luminosa da minha expectativa,
a mais certa certeza de que gosto de ti, como
gostas de mim, até ao fim do mundo que me deste.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Carta...


(Coimbra, Ponte Pedonal Pedro e Inês)

Apetece-me escrever-te uma carta aberta.
Carta aberta de mim. Carta aberta para ti.Carta aberta...

(carta... porquê?; apetecia dizer-te as palavras que o tempo calou...)

Apareceste como um vento sul, impelindo-me para um precipício de palavras, sentimentos e tanto por dizer...
Ficaste além. Além de ti, aquém do sonho. Aquém de nós.

Falas de ausências. Cantas a ausência na voz sussurrada de quem deixou atrás de si o murmúrio de um sorriso antigo. De que falas tu, quando falas de ausência? De que falamos nós, quando cantamos as palavras esquecidas de si, quietas num canto da vila onde deixámos, acesa, a vontade de estar? Onde ficou o riso? Onde mora a paixão? É dessa ausência que falas? É da ausência de mim? Ou da saudade eterna de uma verdade por ser?

Falas da vida e do vento. Ouves a voz da sereia que te canta e se esconde por detrás de uma rocha. Suspensa no tempo, suspensa da vida, numa calma ilusória onde a teia foi tecida. Cada fio é um minuto em que espero por ti. Cada minuto é uma palavra que ficou por dizer. E cada palavra por dizer é um minuto de vida que se perdeu já...

Falo de promessas feitas à vida. Falo de sonhos cujo canto chegou a um céu distante. Falo de Presente e promessas de Futuro. Falo de ti. Falo de mim. Falo do dia em que falhámos um dia à beira-mar. Falo da serenata por cantar. Do amor por dizer. E da sombra do tempo que passa.

Vês?...(acabou de passar uma estrela cadente; pediste um desejo?)

domingo, 1 de novembro de 2009

Poema de Ary dos Santos

Original é o poeta
que se origina a si mesmo
que numa sílaba é seta
noutro pasmo ou cataclismo
o que se atira ao poema
como se fosse um abismo
e faz um filho ás palavras
na cama do romantismo.
Original é o poeta
capaz de escrever um sismo.

Original é o poeta
de origem clara e comum
que sendo de toda a parte
não é de lugar algum.
O que gera a própria arte
na força de ser só um
por todos a quem a sorte faz
devorar um jejum.
Original é o poeta
que de todos for só um.

Original é o poeta
expulso do paraíso
por saber compreender
o que é o choro e o riso;
aquele que desce á rua
bebe copos quebra nozes
e ferra em quem tem juízo
versos brancos e ferozes.
Original é o poeta
que é gato de sete vozes.

Original é o poeta
que chegar ao despudor
de escrever todos os dias
como se fizesse amor.
Esse que despe a poesia
como se fosse uma mulher
e nela emprenha a alegria
de ser um homem qualquer.